sábado, 24 de setembro de 2011

Ira! - Psicoacústica .





Em 1988, o cenário musical brasileiro vivia o auge da ressaca provocada pela explosão do dito Rock Nacional e pela euforia consumista decorrente do Plano Cruzado. 

Uma das bandas a perceber essa transformação foi o Ira!. Vindo de dois discos de indiscutível qualidade, aclamados pelo público e de uma vivência tumultuada com a crítica, o grupo apresentou um novo trabalho que surpreendeu a todos pela proposta inovadora que representava.usar sampler não era algo comum nos idos de 80, o que levou Nasi a procurar o cineasta Rogério Sganzerla para a liberação das frases de seu filme de estréia (O Bandido da Luz Vermelha) para as faixas "Rubro Zorro” e "Pegue Essa Arma”.
Psicoacústica tocou na ferida da cultura musical da época. Em sua concepção, apesar da curta duração , foi um disco muito bem produzido. Poucas vezes no rock nacional se viu tamanho entrosamento entre os integrantes de uma banda. A guitarra de Scandurra nunca esteve tão afiada. Jung não lembrava aquele que um dia fora renegado pelos Titãs sob a alegação de falta de pegada. Nasi e Gaspa, além de impecáveis em suas atribuições, traziam significativas mudanças nas técnicas de gravação. A produção escalada para o disco também se destacava.



A obra ficou marcada na história, no entanto, pela complexa conjunção melodia-letra, aliada ao forte teor crítico das canções proposto pelo grupo. Rubro Zorro, a faixa inicial é um grande exemplo. Baseada na história do Bandido da Luz Vermelha, famoso psicopata paulistano da década de 60, a música é de grande intensidade, recheada de efeitos sonoros retirados do filme-biografia do homenageado, além da impecável declamação de Nasi ao fundo, como se fosse um mantra a retratar a consciência do criminoso. Outro destaque é a faixa Receita Para Se Fazer Um Herói. De letra simples e irônica, é uma verdadeira receita para se transformar “um homem feito de nada como nós” em um mito. Uma mordaz crítica sócio-religiosa. Não foi por acaso a escolhida do grupo para ser reproduzida no disco “ao vivo MTV”. Críticas à Imprensa (Poder Sorriso e Fama), de cunho social (Pegue Esta Arma e Advogado do Diabo) e ao showbizz nacional da época (Manhãs de Domingo) também se fizeram presentes.


Contudo, a mais emblemática do álbum, e uma das mais incompreendidas da história da música nacional é Farto do Rock’n Roll. Verdadeira canção-desabafo, dona de uma letra direta, construída sobre um riff de Scandurra, retratando de forma nua e crua a saturação da fórmula roqueira nacional dos anos 80. Falando da busca de novas fontes de inspiração do grupo, a música apresentava um solo de scratch de Nasi – um dos primeiros da música brasileira – e o refrão grafado em letras maiúsculas no encarte do álbum (Fim de semana sim / Fim de semana não / Às vezes tudo bem / Às vezes sem razão / Já estou farto do Rock’n Roll). Uma verdadeira profecia sobre o cenário do showbizz nacional.

Talvez pelo cunho contestatório, a resposta dada ao álbum não foi a esperada. A crítica não compreendeu a proposta sugerida e o público não assimilou os novos rumos tomados pelo grupo.
Concluído, o trabalho não deixava dúvidas quanto aos méritos. Os problemas ao redor da obra, no entanto, foram vários. Primeiro: a gravadora não conseguiu achar uma música de trabalho. As faixas eram compridas e consideradas difíceis. A reflexiva "Pegue Essa Arma” foi a encarregada de puxar o disco e já determinou seu fracasso - apenas 50 mil cópias vendidas, 200 mil a menos que o antecessor Vivendo e Não Aprendendo.
Por ter antecipado tendências e reunir as melhores canções adultas da banda, o disco manteve seu frescor por todos esses anos. Jogou o Ira! no ostracismo, mas isso é só um porém. Nasi confirma: "Faríamos tudo de novo, nunca achamos que tínhamos dado uma bola fora".Compre .
 
 
 

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